04/12/2015
Uma escola que nasceu pela necessidade da comunidade
Há 15 anos, na área de rural de Itapevi, na grande São Paulo, um casal montou em seu sítio uma escola de Educação Infantil para que a filha de 2 anos e as crianças da região pudessem estudar. Mais e mais famílias se uniram no desejo de fazer a melhor escola possível, e contribuíam como podiam. “Uma mãe de aluno cortava o cabelo das crianças, outro pai tocava violão, outra mãe colaborava com a limpeza”, lembra Stela Grisotti, fundadora da instituição. Contrataram professores e ano a ano aprenderam a como se estruturar. Estava inaugurada a Escola Apecatu.
A filha do casal cresceu e foi estudar em São Paulo. Mas o trabalho na escola de Itapevi não terminou. Pelo contrário, continuou de vento em popa. Já no 9o ano de experiência, a instituição fez uma parceria com a prefeitura, que passou a se responsabilizar pelo envio dos alimentos, da contratação da cozinheira e dos professores. As famílias se afastaram um pouco da colaboração no dia a dia, mas as doações e a participação da comunidade ainda são essenciais para a manutenção do espaço. Quase cem crianças entre 3 e 6 anos foram atendidas em 2015, vindas de famílias com renda mensal de 1 a 2 salários mínimos.
O ambiente da escola é de encher os olhos: a área arborizada tem parquinho caprichado, horta, e animais como patos, coelhos e gansos, e as salas são instaladas em um ambiente feito inicialmente para ser um ateliê de arte. Por todos estes privilégios, e por ser a única instituição de Educação Infantil que atende a região, as vagas dos pequenos são concorridas.
Os primeiros contatos com o projeto
Em meados de 2015, a Apecatu descobriu o Projeto Comunidade de Aprendizagem e se identificou. Stela, a fundadora, ficou animada em notar como o projeto e a escola têm pontos em comum: “Nós temos a prática de trabalhar com as famílias. Mas o projeto de Comunidade de Aprendizagem tem a teoria, a metodologia, já sabe de atuações que podem dar bons resultados. Por isso, queremos implementá-lo de fato”. E Joana Grembecki, formadora de Comunidade de Aprendizagem, fez a mobilização da escola e notou o engajamento e a participação dos 20 pais e funcionários presentes: “Esta é uma escola especial, que nasceu a partir da necessidade local. Por isso, tem um grande potencial como comunidade de aprendizagem”, diz.
Elas não são as únicas a torcer para que a escola ande de mãos dadas com o projeto. Thais da Silva Rosa, de 22 anos, frequenta a Apecatu desde pequena, quando sua irmã era uma das estudantes. Ela se lembra de como sua mãe destinava um tempo para colaborar com a escola no que era necessário. Mas, ano a ano, notou que os familiares se afastaram da escola. “O projeto de Comunidade de Aprendizagem está resgatando o que desapareceu da nossa rotina e estava fazendo falta. Notamos que os pais aos poucos estão participando de fato, trazendo seu pensamento, ampliando as possibilidades de trabalho na escola”, reflete Thais, que hoje é assistente da direção e monitora das turmas.
Em outubro, foi organizada a primeira reunião das comissões mistas – a equipe da escola chegou a fazer convites pessoalmente, de porta em porta, aos vizinhos. Em novembro, novo e esperado passo: houve o dia da coleta dos sonhos, fase importante do processo de transformação, quando a comunidade mostra o que deseja para o futuro. Entre os sonhos das crianças, apareceram desenhos imaginando piscina de bolinhas, um violão e a casa na árvore, entre tantos outros pedidos encantadores. Neste dia, foi também inaugurada a biblioteca e a sala de brinquedos no espaço em que antes funcionava a sede dos caseiros. “Os livros e os brinquedos foram doações de familiares, comunidade e amigos. Além de deixar os materiais disponíveis para as crianças da escola, vamos organizar um rodízio com as famílias para que possam atender visitantes da comunidade e se responsabilizar pelo ambiente. A biblioteca precisa ser de todos”, conta Simone Aparecida de Almeida, diretora da escola há 11 anos.
Stela também tem um grande sonho: “Precisamos mudar nossa cultura e não esperar que o poder público nos dê tudo pronto. Devemos fazer e cobrar quem é responsável por fazer. Ao perguntar: ‘o que queremos’ e ‘quem quer realmente mudar’, começamos um importante movimento. E juntos”. De passo em passo, família, comunidade, escola e crianças transformam sua escola e, quem sabe, tornam piscina de bolinhas, violão e casa na árvore parte da realidade.
Texto de Beatriz Santomauro